sábado, 1 de agosto de 2015

O PALHAÇO ESTÁ CHORANDO 


Era chegado o momento de começar mais um espetáculo. Lá estava ele em seu camarim, preparando sua maquiagem. Os anos foram passando depressa e ele percebia que cada vez mais aquele ato passava a ser mecânico e sem muita empolgação.

Fitou seu rosto sem os traços marcantes que o fizeram ficar conhecido. Estava sozinho é aquela lágrima que caia do seu rosto não poderia ser vista por ninguém. 

Não conseguia mais manter seu segredo: ele como qualquer outro ser humano, sofria. 

Era difícil disfarçar tanta tristeza para aqueles que sempre esperaram seus sorrisos, às vezes até pagavam para vê-lo. A alegria estampada no rosto das crianças fizera com que ele abdicasse do seu verdadeiro eu por longos e longos anos. Mas a vida sempre volta para cobrar suas dívidas.

Hoje, já em estágio de maturidade avançado, não conseguia mais usar aquela maquiagem. Por longos e longos anos, engoliu o choro para fazer bem aqueles que o procuravam, abrindo mão de seus sentimentos em troca do bem estar alheio. Tinha como filosofia de vida, uma música do Queen chamada  “The Show Must Go On” e que, entre outras coisas, diz mais ou menos isso:

“O show deve continuar.
Por dentro meu coração está partido
Minha maquiagem derretendo
Mas meu sorriso... Se mantém firme”

Mas ele não podia mais com isso. Ele não queria mais sorrir. Ao menos algum dia queria ser ele mesmo e compartilhar com alguém os infortúnios que sempre o fizeram definhar por todo esse tempo. 

Mas ele era “o palhaço”. Que sentido tem um palhaço que não sorri e nem provoca sorrisos? Se o palhaço não sorri que motivos eu tenho para sorrir?

Pois é. Sempre ouvia essas indagações quando tentava se abrir com alguém. 

Então aquele que parecia cercado por todos era, na verdade, a mais solitária das almas, condenada a provocar sensações nos outros que nunca fora capaz de experimentar e, portanto, duvidava de sua existência ou força.

Nem sempre somos o que parecemos meia amigos. Muitas vezes usamos o que a psicologia chama de “máscara social”, que nada mais é do que um mecanismo de defesa que nos permite esconder os sentimentos mais profundos e tristes daqueles que não entenderão sua magnitude. Em outras palavras, nada mais é do que disfarçar o verdadeiro “ eu”, que muitas vezes fica tão escondido que quase ninguém o conhece, além de nós mesmos.

Esse texto tem notas de autobiografia como puderam perceber. Digamos que sou um especialista em “máscara social”. Sou, também, um especialista em manter o sorriso mesmo quando meu coração esteja totalmente destroçado, como está agora que escrevo esse desabafo. 

As vezes nos sentimos mortos por dentro. Eu me sinto assim com uma frequência avassaladora e, honestamente, acredito que pouca gente entenderia a dimensão desse sofrimento.

Ao longo da minha vida fui obrigado a ver as pessoas irem embora sem que eu pudesse fazer nada. Minha vida se divide em alguns sentimentos básicos: culpa, impotencia, tristeza, desilusão. Na maior parte do  tempo é assim que me sinto, mas pouca gente sabe disso.

Mais uma vez eu me arrisco ao expor meu interior dessa forma, mas para aqueles que conhecem o lado bom desse que vos escreve, digo: O PALHAÇO ESTÁ CHORANDO. 

Sim, ele também chora e chora muito. Pode ser que amanhã eu volte a colocar a maquiagem e faça meia dúzia de gracinhas ou seja aquela pessoa que todos estão acostumados.

Mas não hoje.

Hoje vivencio um turbilhão de sentimentos e tristezas. É preciso passar por esse luto. Pode ser que amanhã tudo mude e as coisas estejam melhores. Mas não hoje.

A vida nem sempre é um conto com final feliz. Para muitos é mais um filme de guerra, tetros ou suspense, no meu caso ela é um pouco desses três.

Hoje o show não vai continuar. Meu coração está quebrado demais para que eu simplesmente esqueça e mantenha o sorriso. Não hoje.

Perdoem esse palhaço que, hoje, está cansado demais para se maquiar e arrancar o sorriso de todos.

O palhaço está chorando. Ele também é de carne, osso, coração e cérebro. 

Ele também sofre, também chora, também se culpa (e como). Ele se cansa, ele se entristece, ele se chateia, ele sorri muito pouco.

Mas não se preocupem... No fim das contas, ele é só mais um palhaço e o show sempre vai continuar, com ele ou sem ele.

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