segunda-feira, 21 de setembro de 2015


ENSAIO SOBRE O PERDÃO
 
 
 
 
 
Revirando uns papeis velhos que me sobraram da partilha do divórcio, encontrei algo muito significativo e que me fez pensar muito em muita coisa que se passou e ainda se passa na minha vida.
Em 11 de novembro de 2012 fui levado às pressas para o Pronto Socorro, com pressão arterial em 18x11 e totalmente desorientado.
Aquele foi o marco que sentenciou minha condição de hipertenso.
Muitos de vocês já imaginaram onde eu quero chegar com isso tudo.
Porém não é tão obvio assim o que quero dizer.
Evidentemente quero falar de perdão e sobre o pouco tempo que temos na terra, sobre esse breve momento que costumeiramente chamamos de vida. Desperdiçamos boa parte desse tempo alimentando sentimentos ruins por situações que não poderão ser apagadas. Não podemos voltar atrás e corrigir os erros que cometemos. Só nos resta minimizá-los e nos arrepender deles.
Na maioria das vezes agimos sem querer. Ninguém que machucar o outro, ao menos não em um primeiro momento. O medo que temos de nos magoar é chave para que magoemos o outro.
É algo inerente ao ser humano: “antes ele do que eu”.
Mas, não raro, esquecemos tudo o que dissemos ou falamos e a vida vai passando, as pessoas vão passando, até que a saudade daquela presença vem ao coração dizer que erramos. Minha mãe sempre dizia quando éramos crianças que “quem bate esquece, quem apanha jamais”.
Hoje eu vejo o quanto de verdade existe nessa simples frase.
Uma pena que a sabedoria dos mais velhos só é por nos entendida quando estamos, igualmente, velhos.
Então chegamos ao velho dilema: “perdoar ou não perdoar? Eis a questão”. Se buscarmos a resposta na religião, seja qual for, encontraremos a resposta: “para ser uma pessoa iluminada e exercer os dons do espírito devemos perdoar”.
Eu concordo. Como cristão principalmente. Acredito que o perdão é um dos dons mais lindos que o ser humano pode exercer. Porém, um dos mais difíceis.
Digo por experiência própria. Considero-me uma pessoa extremamente rancorosa e não me orgulho nem um pouco disso. Pelo contrário. Tenho vergonha desse meu lado que vem me corroendo por longos 35 anos.
Mas justiça seja feita, eu aprendi a perdoar coisas que antigamente eu nem cogitaria. Relevei situações que, em outros tempos, representariam o fim de qualquer relacionamento, seja amoroso, seja de amizade.
Não acredito que isso seja motivo para querer reconhecimento e aplausos. Nada disso. Acho que perdoar antes de tudo (como cristão) é uma obrigação. Ao menos foi isso que me foi passado ao longo desses anos de igreja.
Entretanto, sabemos que toda obrigação, ainda que de cunho espiritual, gera uma resistência em seu cumprimento.
Perdoar é difícil. Impossível para alguns.
A maioria das pessoas prefere ver o demônio a perdoar alguém que as ofenderam.
Eu já caminhei nessa linha. Hoje meu problema é outro.
O perdão pode (e deve) ser visto sob outra ótica, outra vertente.
Vamos lá.
Como portador de depressão (e todos já estão cansados de saber disso) vivo em constante batalha com todo o tipo de culpa. Não consigo lidar com ela e, honestamente, acredito que nunca conseguirei. Tristemente assumo que venho me conformando com isso.
São dias difíceis. Cada pessoa que magoei nesse mundo, cada vez que não andei na linha, está guardado nitidamente na minha memória e, diariamente sou cobrado por isso. Das menores às maiores culpas, todas me dão “bom dia” antes que eu saia para trabalhar. Toda! Sem exceção.
Muitos podem se identificar com o que vou dizer agora. O fato é que perdoamos o outro com uma facilidade maior do que perdoamos a nós mesmos.
Concluí, então, que eu sou o meu maior carrasco, alimentando uma culpa que – confesso ainda não consegui dominar – constantemente dá as caras.
O que não percebemos é que de nada basta o perdão de quem ofendemos se nós mesmos não somos capazes de perdoar nossas falhas.
De que adianta pedir que sigamos em frente se nós mesmos não acreditamos nisso?
Portanto, antes de exigir o perdão de alguém, pensemos se somos capazes de perdoar a nós mesmos. Não confundam esse ato com a arrogância de pensar que estamos sempre certos.
Não é nada disso.
É saber que como seres humanos somos suscetíveis a falhas. Somos imperfeitos e isso nos torna, ao mesmo tempo, tão belos e especiais. Não fomos feitos para errar. Mas erramos. Não queremos errar, mas erramos.
Essa é a condição imposta pelo nosso livre arbítrio. A liberdade tem sim suas consequências e isso é uma coisa natural. Quando entendemos isso, a vida fica mais leve e mais colorida.
Sentir dor pela magoa que causamos ao outro é humano. Saber aceitar o perdão e perdoar, igualmente a si próprio, é divino.
                                 Essa é a ideia.