Algumas
pessoas deixam nossa vida. Umas de forma violenta e trágica. Outras de forma
natural, apenas sucumbem ao mal que a todos atinge. Algumas vão nos deixando ao
longo do caminho. Outras deixamos para seguir outros rumos.
Porém,
nenhuma despedida é facilmente compreendida, pois toda pessoa que sai da nossa
vida, deixa nela um buraco que dificilmente será fechado. Muitas vezes deixa,
ainda, uma dor profunda, uma cicatriz que seguirá aberta até o fim de nossos
dias.
Esse
ano foi a vez da minha avó completar seu ciclo.
Eu
sei que Deus precisava dela mais do que nós, aqui na terra, mas ainda assim eu
não consigo aceitar sua partida.
Em
seus últimos dias ela já não conseguia distinguir as pessoas e, as piadas que
eu fazia e que sempre arrancaram as mais deliciosas risadas, já não faziam
muito sentido.
Mas
a minha dor talvez seja diferente do restante da família. Nem maior, nem menor.
Apenas um tipo diferente de dor.
Quando
a vi naquele hospital, cheia de aparelhos, nos últimos meses de sua vida,
pus-me a pensar que poderia ter feito mais por ela. Poderia ter dado um pouco
mais de alegria ou motivos que a fizessem sentir mais orgulho de mim.
Mas
não sei se consegui fazer isso. Jamais saberei. Na verdade só ela poderia dizer.
Acredito
que seja uma reação natural de quem fica: pensar que poderíamos ter feito mais
por quem partiu ou ter dado mais alegrias àquela pessoa.
Porém,
esse sentimento ainda me persegue, junto com a saudade.
Lembro
das tardes que passei sentado ao lado do seu fogão à lenha, apenas ouvindo e
ouvindo seus incessantes ensinamentos. Sua sabedoria “caipira” sempre pautou inúmeras
de minhas ações enquanto homem, apesar de ela nunca ter conhecimento disso.
Eu
adorava viajar a noite toda em um ônibus desconfortável e pouco seguro quando
ia visita-la. E por qual razão?
Porque
no final daquela estrada perigosíssima e daquela viajam massacrante, eu sabia
que a recompensa seria sua voz, seu abraço e seus carinhos. Ansiava meses por
essa sensação.
Talvez
a gratidão que sinto por ela possa ser resumida na resposta que dei a ela
quando ela me disse:
-
Filho, eu não pude nem comprar um presente para você!
Eu,
então, disse:
-
Vó, a senhora me deu o maior presente de todos: a vida!
Foi
triste saber que ela partiu. Eu nem consegui dizer adeus, dizer o quanto sou
grato por tudo o que ela fez, pelo tempo que ela dedicou a ouvir minha lamúrias
e dar um pouco de sua sabedoria e carinhos infinitos.
Não
consegui pedir perdão pela falta de tempo que muitas vezes me impediu de ir visita-la,
talvez no momento que ela mais precisasse.
Assim
como eu, minha avó sofria de depressão. Mas, assim como eu também, poucas
pessoas (as mais próximas) conseguiam perceber.
Portanto,
eu poderia ter feito mais por ela, ter ficado mais ao seu lado. Eu sabia o
quando isso poderia fazer diferença.
Porém,
ela se foi. E com ela um pedaço de mim, que jamais será preenchido.
Sinto
sua falta. Ainda é muito difícil acreditar que tudo acabou: As risadas, as
histórias. Tudo!
Como
disse, Deus entendeu que era a hora dele ter tudo isso só para ele. É o que
chamo de “Prerrogativa do Criador”.
Eu
entendo e respeito isso. Sei que ela está num lugar muito melhor do que esse em
que estamos hoje. Mas sua partida ainda me dói.
Mas
o que mais me machuca é o fato de que eu não consegui me despedir.
Queria
que ela soubesse, antes de partir, que sua existência, além de uma questão
biológica óbvia, foi de extrema importância para minha formação como homem e
para que eu chegasse onde cheguei hoje, apesar de saber que a caminhada é longa
e eu estou apenas no início. Sem ela não teria conseguido nem isso.
Sei
também que a vida se renova. O maior exemplo disso são minhas duas lindas sobrinhas
e a terceira que está por vir.
Entretanto,
sinto também por elas que não terão essa referência de amor que tive. Um amor
diferente, que rompe as barreiras do tempo e da lógica. Um amor, simplesmente, “amor”.
A
vida perdeu um pouco mais do sentido. Eu perdi um pouco do que sou. O mundo
perdeu a pessoa mais sábia de todas.
Mas
Deus ganhou mais um anjo.