BARCELONA
Essa poderia ser
mais uma estória com o selo de qualidade “Almodovar” ou “Woody Allen”, mas não
tenho tanta pretensão assim.
Mas importante que
fique registrado: poderia.
Estou prestes a
contar como a vida de uma pessoa pode sofrer uma reviravolta impressionante em
questão de dias. Como um furacão que tira o trem de sua rota e o coloca em
outra direção.
A vida de Luciano
estava uma bagunça só, tanto profissional, quanto pessoal e amorosa. Lutava
constantemente com o sentimento de desesperança e a falta de animo para as
tarefas mais corriqueiras. Queria mudar. Precisava mudar.
Havia passado por
relacionamentos que sugaram dele o que tinha de melhor, tornando-o irreconhecível
e de certa forma “estranho”. Estava cansado das mesmas cabeçadas que vinha
dando ano após ano sem mudar o enfoque de seus objetivos. Mas era hora de virar
esse jogo.
Estava sozinho há
alguns meses, após mais uma de suas desilusões e entregas mal sucedidas que
sempre deixavam alguma marca indesejada no seu coração. Estava farto daquilo.
Era publicitário e
tinha uma pequena agencia em sociedade com outros três amigos, de longa data.
Porém, as ideias estavam fugindo cada dia mais e ele via que não pertencia
àquele lugar. Sentia-se abarrotado e sem espaço para novos pensamentos,
precisando urgente de uma reciclagem de ideias.
Em uma terça feira
qualquer, pegou seu carro como sempre fazia e foi em direção ao trabalho, perdido
em seus inúmeros pensamentos que sempre vinham acompanhados de uma trilha
sonora quase sempre não muito convencional. Olhava as pessoas na rua e pensava:
“quantas delas anseiam por uma mudança assim como eu? Quantas estão cheias
dessa vida que levam?”. Após quase atropelar um motoqueiro – e ser espancado
por ele - teve a grande ideia de sua vida: “iniciaria um ano sabático e
viajaria para algum lugar aleatório atrás do melhor momento de sua vida”.
Obviamente não
sabia qual seria esse momento ou o que faria, ou mesmo para onde iria, mas
estava disposto a abraçar o desconhecido e as possibilidades que com ele
viriam.
Ansioso, chegou à
agencia e comunicou a decisão aos sócios. Por cerca de uma hora e meia teve de
conter os ânimos dos amigos que queriam de todas as formas dissuadi-lo dessa
ideia (ameaçando-o fisicamente inclusive). Mas ele se manteve firme e assumiu
todos os riscos de uma empreitada dessa magnitude.
Eram amigos de infância
e a ideia de Luciano não abalaria tal relação. Tanto é que tiveram a brilhante
ideia de ajuda-lo a escolher o destino da viagem: pegaram um velho “mapa mundi”
que guardavam da época de escola e, vendando os olhos de Luciano, fizeram com
que ele espetasse aleatoriamente algum lugar naquele vasto mundo.
Nessas horas o
destino costuma agir de formas inimagináveis. Ao retirar a venda Luciano
assustou-se em saber que deveria se preparar para conhecer Barcelona.
- Mas como assim?
Eu nem falo espanhol!!! – pensou consigo mesmo. Porém, logo em seguida refletiu
e rebateu: “Se eu estou atrás do grande momento da minha vida que seja em
grande estilo e com a cara e a coragem!”
E, com a ajuda dos
amigos partiu rumo a Barcelona levando meia dúzia de sonhos e expectativas e um
portunhol sofrível.
Luciano era um ser
humano peculiar. Não levava as coisas muito a sério e adorava colecionar
camisetas com frases engraçadas. Era um eterno adolescente. Obviamente aquilo
não lhe atribuía muita credibilidade, mas ele não se importava muito com isso.
Preferia levar a vida de forma leve e bem humorada, mesmo sem saber que as
frases eram ridículas demais e eram capazes de despertar a vergonha alheia em
qualquer um que o visse usando aquelas camisetas.
E, com a frase: “Picolé
Trevoso” estampada em uma camiseta - ele
não tinha a noção exata do ridículo - embarcou em São Paulo com destino a Barcelona
sem saber uma palavra em espanhol.
Enrolando um “portunhol”
asqueroso conseguiu chegar até o hotel onde, ainda no hall, com a mochila nas
costas e aquela camiseta ridícula percebeu que sua vida estava por mudar. Ainda
na fila do “check in”, notou a presença de alguém, rodeada de pessoas, parecendo
bem conhecida por aqueles lados.
Era linda. Alta.
Olhos claros, loira e obviamente jamais olharia pra um cara que mais parecia
ter chegado de um acampamento de sete dias e sete noites em Machu Picchu, com a
barba por fazer e, com uma camiseta horrorosa daquelas, tudo ficava ainda mais
impossível.
Mas ele não conseguia
parar de olhar para ela. Ela estava cercada de pessoas, falando com todos,
requisitada e, naquele mesmo momento, Luciano ouviu uma voz que dizia ao som de
Capital Inicial: “você é tão articulada, quando fala não pede atenção”. Sabe
aquelas cenas de filme em que a moça parece ter um ventilador no rosto, os
cabelos ao vento e o sujeito com a maior cara de apaixonado? Então me ajudem e
construam essa cena por favor!
De repente, acordou
daquele transe momentâneo. Era sua vez de fazer o “check in” e arranhando
aquele portunhol sofrível perguntou ao gerente do hotel quem era aquela moça
que tanto chamava sua atenção. Tratava-se de uma jornalista esportiva,
brasileira, que estava em Barcelona para cobrir “El clasico” que aconteceria
naquele final de semana no Camp Nou, estádio do Barcelona.
Luciano adorava
futebol, mas conhecia pouco dos campeonatos europeus, muito embora já tivesse
reservado seu ingresso para aquele jogo que era o mais esperado daquele período
em todo o mundo. Estaria lá e ela também, mas tinha a total convicção que não a
encontraria no dia do jogo.
Naquele momento ela
virou e deu de cara com ele. Olhou direto para a camiseta e sorriu. Encabulado,
Luciano sorriu de volta, mas a moça seguiu seu caminho sem muito alarde e ele
foi para o quarto tentar descansar um pouco da viagem. Em vão.
Ela não saia da cabeça
dele. Aquele sorriso penetrou direto em sua alma e ele parecia não acreditar
que era pra ele que ela havia sorrido. Em meio a toda essa emoção adormeceu e,
no dia seguinte iniciou os preparativos para o jogo.
O portunhol falhava,
mas ele se virava da maneira que conseguia e assim foi até chegar ao estádio
onde a torcida já estava se aglomerando. Mas uma coisa não falhava: o péssimo
gosto por camisetas. Escolheu uma para o jogo que era tão vergonhosa quanto
incompreensível. Tinha apenas a inscrição “Mah oehhhhhhh”, fazendo uma
referencia ao famoso bordão utilizado por Silvio Santos em seu programa de
domingo. Evidentemente havia falhado na missão de ser uma pessoa normal.
Ninguém na Espanha saberia
o que significava aquilo e ele assim se lançou em direção à entrada do estádio.
Ainda perdido ouviu uma voz que dizia: “mah oehhhhhhh foi de matar hein”.
Por mais obvia que
seja essa parte do conto é necessário digredir um pouco amigos com o objetivo
de imprimir certa dramaticidade ao relato:
Primeiro: quem
reconheceria a camiseta? Segundo: quem falaria português naquele lugar?
Adivinharam? Sim. Ela
se lembrou dele e por coincidência o encontrou na entrada do jogo.
- Eu jamais
imaginaria que encontraria você por aqui. Aliás, desculpe a falta de educação, eu
nem seu sei nome. – disse Luciano sorrindo encabuladamente.
- Meu nome é Paloma
e você só está perdoado porque eu gostei da sua camiseta. – disse ela sorrindo
e fazendo todo aquele gelo que tomava conta do encontro inesperado derreter em um
instante.
- Bom, eu me chamo
Luciano e confesso que minha mãe sempre me disse que minhas camisetas serviriam
para alguma coisa algum dia. Mentira ela nunca falou isso. – Disse ele já
arrancando alguns sorrisos dela. Luciano tinha um problema sério (mais um):
quando estava nervoso sempre fazia alguma piadinha. Quase nunca dava certo. Mas
quando dava amigo...
Lembram quando eu
disse que o destino costuma agir das maneiras mais improváveis? Então. Dessa vez
ele conseguiu colocar os dois lado a lado no estádio, onde assistiram ao jogo juntos.
Conversaram muito
durante todo o tempo e Paloma disse que voltaria ao Brasil no dia seguinte. Luciano,
por sua vez, voltaria uma semana depois e quando aqui chegasse planejaria qual
seria seu próximo destino. Mas, de qualquer forma, sabia que seu ano sabático
havia começado da melhor maneira possível.
Ele ainda não havia
percebido a empatia que desenvolvera com Paloma e só desejava que o tempo não
passasse jamais, pois a companhia era, além de agradável, um balsamo naquela
terra tão distante e que mal tinha conhecimento além de algumas pesquisas
feitas antes da viagem. O jogo acabou e Paloma teria uma longa jornada cobrindo
os bastidores e, portanto se despediram (contra sua vontade obviamente). Trocaram
telefones, mas Luciano tinha a impressão de que jamais veria a moça, seja na Espanha,
em Marte, Beverly Hills ou no Brasil, quando voltasse.
Porém, era tarde
demais. Estava apaixonado e dificilmente se esqueceria daquela voz “articulada
falando sem pedir atenção”.
Durante o tempo que
ficou na Espanha não conseguiu pensar em outra coisa que não fosse o sorriso de
Paloma. Sequer se lembrava do resultado do jogo, ou do trajeto hotel/estádio.
Só conseguia pensar em Paloma, em seu olhar, sua voz.
No fim de sua
jornada embarcou de volta ao Brasil com a certeza de que poderia abreviar seu
ano sabático, pois encontrara em Paloma o momento de sua vida, apesar de sentir
que dificilmente se falariam novamente.
Já em terras
tupiniquins, pensou em ligar para Paloma, mas faltou coragem. Tudo foi tão
perfeito que ele ainda sentia como se estivesse dentro de um sonho e que esse
era o plano do universo: que apenas ficassem nesse encontro e nada mais.
Fazia um mês que
tinha voltado para casa e a coragem para procura-la ainda não tinha aparecido. Já
tinha decidido voltar ao trabalho, focar em seus projetos e tentar encarar a
realidade como a única coisa a se fazer. Assim estava seguindo, mas com o
coração ainda em Barcelona, ainda em Paloma.
Em toda a sua vida
jamais havia se deparado com uma paixão tão avassaladora e incontrolável a
ponto de paralisar seus sentidos e retirar toda a coragem de procurar a
causadora de todo aquele frisson que tomou conta dele.
Paloma era linda,
inteligente, culta, completa e diferente de todas as pessoas com as quais Luciano
havia se deparado ao longo de sua vida. Ela poderia ser a mudança de vida que
ele sempre esperou, mas ele era covarde demais para se lançar atrás dela.
Poderia assusta-la, poderia dar a entender algo que deixasse a moça
constrangida. Poderia parecer ansioso e inconveniente. Poderia parecer um maníaco,
enfim... a cabeça daquele homem era negativamente fértil.
Era um completo
covarde. Sabia disso, mas estava paralisado.
Até que um dia,
notou que uma mensagem chegou ao celular:
“Por
onde anda o maluco mais adorável que já pisou em Barcelona? Senti falta das
suas travessuras”
Sim, ela sentiu
falta dele. Se ela soubesse o quanto de sono ele perdeu pensando nela... A
partir dali conversavam como se não houvesse amanhã. Sobre todos os assuntos
possíveis e imagináveis. A conversa fluía. Riam juntos. Luciano, pela primeira
vez na vida, sentia-se bem por estar perto de alguém, mas ainda tinha medo de
demonstrar que estava apaixonado.
Mas estava.
Perdidamente. Incontrolavelmente. Irremediavelmente.
Queria vê-la, ouvir
sua voz, sentir seu perfume, olhar no fundo dos seus olhos. Nesse momento a
coragem voltou e ele propôs que se encontrassem para um café. Ambos tinham o mesmo
prazer pelo café. Nada melhor do que começar por um café não é verdade?
E se encontraram
numa tarde de sábado, em São Paulo. Luciano ainda não conseguia acreditar que
ela estaria ali, novamente, diante dele.
Paloma era tão
madura e Luciano tão “moleque”. Eram como se fossem “Eduardo e Monica” da vida
real e como diz a musica: “Quem um dia irá dizer que existe razão nas coisas
feitas pelo coração? E quem irá dizer que não existe razão?” O destino se
incumbiu de aproxima-los, tão diferentes, tão perfeitos. O resto o coração
faria sozinho.
Completavam-se na
medida em que não eram parecidos. Ela dizia que ele tinha o bom humor que lhe cativava
e ele encontrava nela a maturidade que tanto havia procurado em uma
companheira. Paloma dava a Luciano a tranquilidade que nenhuma outra mulher
havia dado em sua vida. Aquele lance da “sorte de um amor tranquilo” (que
Luciano achava tão piegas) estava finalmente acontecendo com ele.
Tudo começou em
Barcelona, tudo começou com futebol, tudo começou com uma mudança. A mudança
que Luciano sempre procurou para si mesmo encontrou em Paloma que, com apenas
um sorriso, fez reviver um coração tão machucado pelos percalços que a vida lhe
impôs ao longo de todos esses anos.
Com um olhar ela
foi capaz de acender a chama da vida havia se apagado há muito em sua alma. Ao
permitir que Luciano seguisse ao seu lado, Paloma despertou o melhor dele e fez
com que procurasse ser melhor ainda a cada dia.
Nitzsche disse
certa vez que: “A vida sem musica seria um erro.” Pois Paloma devolveu a
Luciano a musicalidade que havia se perdido de sua vida. E em grande estilo,
pois não existe canção mais perfeita para descrever esse conto do que essa:
“Forever - Kiss
Eu tenho que dizer o que estou
sentindo por dentro
Eu poderia mentir para mim mesmo, mas é verdade
Não há como negar quando olho em seus olhos
Garota, eu estou perdendo a cabeça por você
Eu poderia mentir para mim mesmo, mas é verdade
Não há como negar quando olho em seus olhos
Garota, eu estou perdendo a cabeça por você
Eu vivi tanto tempo
acreditando que todo amor é cego
Mas tudo em você
Está me dizendo que desta vez é
Mas tudo em você
Está me dizendo que desta vez é
Pra sempre, desta vez eu sei
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
Eu ouço o eco da promessa que
eu fiz
"Quando você é forte, pode seguir sozinho"
Mas estas palavras soam distante quando olho pra você
Não, eu não quero seguir sozinho.
"Quando você é forte, pode seguir sozinho"
Mas estas palavras soam distante quando olho pra você
Não, eu não quero seguir sozinho.
Nunca pensei que colocaria meu
coração na linha
Mas tudo sobre você
Está me dizendo que agora é
Mas tudo sobre você
Está me dizendo que agora é
Pra sempre, desta vez eu sei
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
Sim!
Eu vejo meu futuro quando olho
em seus olhos
O seu amor fez meu coração viver
Porque eu vivi minha vida acreditando que todo amor é cego
Mas tudo em você, está me dizendo desta vez
O seu amor fez meu coração viver
Porque eu vivi minha vida acreditando que todo amor é cego
Mas tudo em você, está me dizendo desta vez
É pra sempre, desta vez eu sei
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
Oh!
Pra sempre, desta vez eu sei
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
E não há nenhuma dúvida em minha mente
Pra sempre, até que minha vida termine
Garota, eu vou te amar pra sempre
Luciano tinha a
mais absoluta convicção que Paloma era a mulher de sua vida.
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