terça-feira, 9 de julho de 2013

"UM CONTO SOBRE PARTIDAS E CHEGADAS - PARTE III"

 

Alguns meses depois do acidente o sonho que eu havia tido com o meu tio ainda me assombrava, muito embora eu soubesse que aquela mensagem precisava ser entregue e, de fato, foi.

Mas a vida precisava prosseguir.

O ano seria longo e a vida deveria seguir. Eu ainda teria que me submeter ao exame da OAB para obtenção da carteira de advogado. Portanto, por mais trise que eu estivesse e por mais que a vida tivesse perdido o sentido eu precisava ir adiante.

Sabia que a memória dos momentos bons que passei com eles jamais se apagaria e, assim, retomei o curso da minha vida.

No mês de abril, na semana santa, estávamos em casa aproveitando o feriado quando minha mãe veio com a seguinte notícia:

- Fiquem preparados pois o avô de vocês está no hospital e parece não ter muito tempo de vida.

A notícia não surtiu efeito impactante sobre mim, pois o pai do meu pai nunca foi uma pessoa muito presente em nossas vidas. Pelo contrário! Sequer registrou meu pai, por motivos que desconhecemos.

Em princípio a preocupação maior foi com meu pai, uma vez que eu pouco lembrava do meu avô. Ele deve ter ido umas três vezes no máximo na nossa casa.

Mas eu lembrava do meu pai e do que ele dizia quando éramos crianças. Presenciei alguns momentos de profunda tristeza do meu pai, pela ausência que aquela pessoa imprimiu em sua vida.

Geralmente no dia dos pais, onde, em algumas ocasiões o peguei chorando escondido.

Por mais que fizéssemos presentes na escola ou comprássemos alguma lembrancinha eu sabia que ele sentia a falta do pai e dos irmãos que não conhecia.

Uma vez ele, vendo um programa de televisão, onde um irmão brigava com outro, disse (eu me lembro que tinha cerca de sete ou oito anos na ocasião):

- Nossa, se eu tivesse um irmão eu ficaria grudado nele! Jamais brigaria com ele. Esse povo não sabe o que está fazendo!

Isso incomodava meu pai. Por mais que ele tivesse uma irmã por parte de mãe, o fato de saber que tinha vários outros irmãos desconhecidos o deixava triste. Uma outra vez ele disse aos meus irmãos e a mim: “O melhor amigo que você pode ter nessa vida é o seu irmão”.

Essas palavras ficaram cravadas na minha cabeça.

Pois bem, naquele mesmo dia onde a notícia que meu avô estava nas últimas, algumas horas depois, o telefone tocou. Percebi um certo “corre corre” em casa e logo pude constatar que se tratava de algo relacionado ao meu avô.

Minha mãe então disse que uma irmã do meu pai estava em São Paulo para acompanhar meu avô no hospital e que estava a caminho da nossa casa para nos conhecer.

Aquilo foi como se um meteoro caísse naquela casa. Meu pai corria de um lado para o outro até que, no meio da cozinha, parou e entregou-se ao pranto.

Um choro de alívio e de medo ao mesmo tempo. Todos nós nos abraçamos e, pouco tempo depois, lá estava minha tia Marizete, em casa. A semelhança com a minha irmã era tão impressionante que pareciam mãe e filha.

Ficamos a tarde toda acertando todos os desacertos do passado e meu pai, o tempo todo grudado nela.

Percebi que era verdade aquela vontade de “não largar mais”.  

O tempo passou tão rápido aquele sábado. Quando percebemos já era tarde e ela teve que ir embora.

Pela manhã do domingo, o telefone toca mais uma vez, logo cedo: meu avô havia falecido. Era minha “nova” tia que havia ligado e avisado que os demais irmãos, sabendo que ela tinha enfim conhecido meu pai exigiam a presença da família inteira no enterro.

E lá fomos nós! Apreensivos. Não sabíamos qual seria a reação dos demais tios e primos. Poderia ser de repulsa, poderíamos ser considerados invasores. Não sabíamos ao certo o que esperar. Mas, quando lá chegamos, o clima era totalmente outro!

O que era para ser um enterro acabou virado uma grande festa.

Era um tal de “olá eu sou sua tia”, “olá eu sou seu primo”. Abraços de todos os lados! Parecia que nos conhecíamos há anos!

Como a vida é curiosa. Um dado momento naquele dia eu, olhando para uma pessoa que havia chamado muito minha atenção, perguntei para minha mãe: “Mãe, quem é aquela mulher?” Minha mãe respondeu com uma naturalidade que jamais seria vista em mim: “Ué, ela é sua tia, irmã do seu pai!”

Minha admiração veio do fato de eu pegar o mesmo ônibus que ela pegava por cerca de dois anos!

Isso mesmo! Eu estava no mesmo espaço físico de uma tia minha por tanto tempo e, nem eu nem ela, sabíamos disso! Morávamos tão perto e mal poderíamos desconfiar disso!

Saldo daquele funeral: Meu pai havia ganhado seis irmãos: Marizete, Moisés, Osvande, Marisa, Dorival e Betania.

Eu havia ganhado muitos primos, um mais “gente fina” que o outro!

Não deu para não pensar no quanto a vida é engraçada.

Eu que já tinha passado por tanta tristeza naquele mesmo ano, agora sorria e encontrava esperanças naquelas novas pessoas que eram introduzidas de forma tão abrupta e tão bem vinda nas nossas existências.

Engraçado que a morte do meu avô serviu para que meu pai finalmente conhecesse seus tão aguardados e já amados irmãos!

Acredito que tenha sido seu último ato de redenção: reaproximar a família.

Hoje mantemos contato constante com alguns desses novos parentes. São pessoas adoráveis e que aprendemos a amar sem muito esforço, pois são “gente como a gente”. Alguns, por força das circunstâncias acabaram se afastando, mas é possível entender que a vida leva as pessoas para caminhos diferentes e muitas vezes distantes. Mas o amor por eles se mantém intacto e, sempre que podemos mandamos um “alô” ou eles mesmo nos mandam lembranças.

A vida nos ensina lições à sua própria maneira. Sem perguntar se queremos desse jeito ou daquele. Apenas acontece e aprendemos algo com isso tudo.

Eu que pensei que jamais voltaria a sorrir, algum tempo depois descobri que tinha novos motivos para isso.

Mas as brincadeiras do meu “Tizé”, sua alegria, seu caráter e seu espírito acolhedor, jamais sairão da minha mente e do meu coração.

Eu aprendi que existem várias formas de amar: amor de pai, de mãe, de avó, de avô, de marido, de mulher, de filho, de filha e, por fim, amor de tio.

Esse é um amor diferente, não é de pai, não é de avô. É um amor de amigo e ao mesmo tempo um amor protetor.

Mas a pergunta é, como eu sei que amor é esse?

Respondo-lhes meus queridos: Deus me proporcionou a oportunidade de honrar a memória do meu tio sendo o mais próximo do que ele foi para mim, para minhas sobrinhas.

Maria Clara veio ao mundo no dia 06 de julho de 2013 e, quando ela nos foi apresentada, ainda no berçário eu senti meu tio do meu lado me dizendo: “Você será um excelente tio!” Dava pra ver o sorriso no rosto dele presenciando o amor que ele nutria por nós sendo passado para mim e meus irmãos, como se fosse um legado que se transfere.

Esse amor é tão grande e tão forte que esquenta o coração e faz com que nos sintamos mais humanos.

Eu sei que jamais chegarei aos pés do que o meu tio representa para mim, mas eu prometo não só a ele como às minhas duas sobrinhas que farei o meu melhor.

Maria Clara, filha da minha irmã Cindy já está entre nós e em dezembro é a vez da Bia, filha do meu irmão Rodrigo.

O que posso deixar registrado para elas é que: Minhas princesas, o titio as ama mais que a ele mesmo! Vocês são os tesouros que papai do céu pôs em nossas vidas, devolvendo o sentido para tudo isso!

Para Deus eu digo: “levei muito tempo para entender seus propósitos, mas hoje, mesmo que o tenha negado e questionado e, ainda, não entendendo por qual razão as pessoas boas devem partir, compreendo a razão disso tudo”.

Hoje esse amor é meu! Hoje a sensação é minha. Hoje o sorriso e alegria que eu presenciei por tantas vezes no rosto do meu tio, enche meu coração!

Obrigado “Tizé” por todo o amor que o senhor me deu ao longo de tantos anos e desculpe por não ter conseguido retribuir esse amor a tempo, mas prometo que, em sua homenagem, serei um tio tão amoroso quanto o senhor foi.

Não posso estar com o senhor, mas sei que o senhor seguirá sempre em mim!

 

2 comentários:

  1. O percurso de cada família é único; é construído por tramas de varias texturas e cores. Cada família tem suas misturas com seus valores, hábitos e condutas e características singulares, onde a dignidade a decência brio são heranças propagada pela nossa criação e formação, e é essa humanização que nos ensina a maneira de amar, fazer distinção das coisas e seres e o caminho a seguir. Nos episódios nos capítulos da tua vida, você plantou encanto harmonia estima respeito. Então você só poderia colher frutos de bem querença; admiração conquista, feito, sorte, sucesso vitória.Que vc continue semeando cultivando bons sentimentos e mais possibilidades de colher deliciosos frutos.
    (Até aqui muitas das pag da tua vida coincide com a minha acredite)
    ,

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  2. Boa Lê... Vc será um super tio... E como diz a música:

    "Todos os dias é um vai e vem
    a vida se repete na estação
    Tem gente que chega pra ficar
    Tem gente que vai pra nunca mais
    Tem gente que vem e quer voltar
    Tem gente que vai e quer ficar
    Tem gente que veio só olhar
    Tem gente a sorrir e a chorar

    E assim chegar e partir
    são só dois lados
    da mesma viagem
    O trem que chega
    é o mesmo trem da partida
    A hora do encontro
    é também despedida
    A plataforma dessa estação
    é a vida desse meu lugar
    é a vida desse meu lugar
    é a vida..."

    Brindemos as Vidas Novas... Jamais esquecendo das Vidas que passaram pelas nossas vidas...

    Bju...

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